CARTA AOS/ÀS ESTUDANTES DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL DA AMAZÔNIA DA UFPA E À COMUNIDADE DE HISTORIADORES E HISTORIADORAS.

Ao abrir o portal Universidade Federal do Pará (UFPA), o curso de História é apresentado em duas modalidades: licenciatura e bacharelado. Assim como na formação para a docência, ao bacharel busca-se “a compreensão dos processos históricos” da Amazônia, enfatizando-se “a formação em História tendo a experiência amazônica e brasileira como suportes estruturantes dos percursos curriculares”. A seguir a questão-chave: a formação para o Bacharelado tendo uma compreensão ampliada da atuação do historiador junto à sociedade”.

Sejamos claros: a não oferta de vagas para o Curso de Bacharelado em História, no próximo processo seletivo da UFPA, nada tem a ver com o número de professores da Faculdade, com a falta de candidatos ao curso ou ausência de perspectivas de empregos futuros, entre outros argumentos similares apresentados pelos defensores de tal proposição.

A polêmica não é nova. A ANPUH, criada 19 de em 1961, foi sem dúvida uma iniciativa para pensar a formação dos/as novos/as historiadores brasileiros/as e a produção historiográfica no país. O Curso de História da UFPA até 1988, formava apenas licenciados, parcela dos docentes não era historiadores em sentido amplo, não eram pós-graduados; não se fazia pesquisa e/ou produzia conhecimento. Os cursos de História no país, em especial das universidades públicas, passaram por rigorosa avaliação naquela década e uma das principais constatações foi que as licenciaturas (maioria absoluta dos cursos vigentes à época) formavam profissionais para repetir o que já existia na historiografia, não eram habilitados em realizar pesquisas e as disciplinas ofertadas sem especialistas no campo em questão, como se constata ao analisar os programas dos cursos.

As teorias e metodologias não compunham os currículos da maioria dos cursos. O conhecimento histórico sobre o Norte do Brasil, em obras de caráter didático, se reduzia a poucos parágrafos relacionados a conquista, ocupação, economia da borracha. A própria historiografia brasileira desconhecia ou ignorava a parca produção acadêmica oriunda dos centros universitários amazônicos. Predominava ainda a perspectiva da historiografia do Estado, que naquela época, muito mais que hoje, tinha como referência o Sudeste e o Sul do Brasil.

Na distribuição das cargas horárias das disciplinas ofertadas, as disciplinas ditas pedagógicas predominavam, abarcando quase metade do total das cargas horárias dos cursos de História, sem qualquer conteúdo historiográfico e sim de métodos e técnicas de instrução de conteúdos legais. A pósgraduação não estava no RADAR da maioria das faculdades de história.

Entre 1960 e 1980, vivemos sob a ditadura civil-militar e os cursos de História do país sofreram ataques diversos, inclusive a proposta de sua extinção e substituição em todos os níveis do ensino. Para substituíla criaram a Educação Moral e Cívica-EMC, Organização Social e Política do Brasil-OSPB e Estudos de Problemas Brasileiros-EPB, e para o antigo curso primário foi Estudos Sociais. Após a promulgação da Constituição em 1988, estas mazelas foram extintas.

Ainda em 1988, após longas discussões sobre a REFORMULAÇÃO do Curso de História na Faculdade da UFPA, a proposta aprovada foi a formação do PROFISSIONAL em História, em que o/a estudante ao concluir recebia o diploma de bacharel e licenciado/a em História, pois ao logo do percurso do curso eles/as eram formados para exercer a pesquisa e o magistério/ docência. Vários professores atuais da Faculdade de História se formaram e obtiveram os dois diplomas.

Também registramos que, graças à essa formação em bacharelado, vários profissionais de HISTÓRIA estão em postos fundamentais para a pesquisa e a gestão em arquivos, bibliotecas, museus e instituições diversas. Podemos citar como exemplo, o diretor do Arquivo Público do Estado do Pará, a diretora do Museu do Estado do Pará, responsáveis pela divisão de pesquisa e documentação do Sistema Integrado de Museus do Pará, e pelo setor de documentação e obras raras da Biblioteca Pública Arthur Vianna, departamento de Patrimônio Histórico do Estado do Pará, além de vários profissionais da história nas mais diversas áreas de gestão cultural e artística do Estado e nos diversos municípios do Para. Esse debate também é nacional. Recentemente, ainda no início deste mês de abril, Leandro Grass, anunciou que um membro da ANPUH terá assento no Instituto Nacional do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

Não foi o número limitado de docentes que impediu ao então Departamento de História que enfrentasse a necessidade de uma formação mais ampla dos profissionais de história, para esses ocupassem postos importantes e contribuíssem para o desenvolvimento transdisciplinar da pesquisa em História.

Paralelamente às mudanças na Graduação em história a Faculdade iniciou a preparação para a futura criação da Pós-graduação, ofertando vários cursos de especialização em História e em História da Amazônia e o envio de docentes em exercício, para fazer a Pós-graduação em Programas de outros estados, ao longo dos anos de 1990. Também buscou a ampliação do número de professores da faculdade. Em 2004 teve início a promoção da Pós-graduação com a instalação do Mestrado em História Social da Amazônia, como também a oferta de turma de Doutorado em História em convênio com a PUC São Paulo. O que requereu ampliar o número de docentes. Não foi fácil, mas em 2010, implantou-se o Doutorado em História Social da Amazônia.

Temos que lembrar ainda que foi uma luta histórica da ANPUH, a regulamentação da profissão de HISTORIADOR(A), conquistada por meio da Lei Nº 14.038, de 17 de agosto de 2020, resultante do Projeto de Lei 4699/12, do senador Paulo Paim (PT-RS), com a colaboração efetiva dos quadros de nossa associação, aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal.

TUDO ISTO SEM EXTINGUIR VAGAS, OU NÃO OFERTAR O ENSINO NOTURNO, E MUITO MENOS DEIXAR DE OFERTAR NENHUMA DAS MODALIDADES DA FORMAÇÃO DO PROFISSIONAL DE HISTÓRIA PELA FACULDADE. Portanto não é aceitável os atuais argumentos.

O que é necessário aos componentes da Faculdade, em especial os/as professores/as é:

- Repensar a formação do Profissional em história que a Região precisa para ensinar, pesquisar e PRODUZIR CONHECIMENTO HISTÓRICO;

- Se empenhar em buscar ampliar as vagas de docentes para a Faculdade, o que significa dialogar com as instancias administrativas da UFPA;

- Manter e ampliar a INCLUSÃO de alunos/as trabalhadores nas turmas noturnas, assegurando suas permanências e uma excelente formação a eles/elas.

- Discutir, rever e/ou adaptar em nível local e nacional a legislação que foi alterada, mas contínua mantendo a esdrúxula distinção entre Bacharelado e Licenciatura na perspectiva de promover a formação do/a profissional em história, apto para a pesquisa e docência.

- Avançar na discussão sobre a importância e necessidade da História Pública, no sentido de promover uma historiografia sobre questões candentes, ampliando o mercado de trabalho e evitando os retrocessos econômicos, culturais e sociais que vivenciamos nos últimos quatro anos.

O que queremos com essa decisão esdrúxula?

Seria reduzir a formação dos DO/AS FUTUROS/AS PROFISSIONAIS DE HISTÓRIA EM NOSSA FACULDADE? E limitá-los à experiencia de sala de aula, sem a possibilidade de atuação na pesquisa e na gestão de acervos e políticas públicas de espaços fundamentais para a área de história? Que interesses e projetos pessoais estão por trás desse projeto contra o bacharelado em História?

Como amazônidas, nos colocamos contra as assimetrias regionais, que nutrem os grandes centros e universidades do sudeste e do sul dessa múltipla experiência, e renegam as universidades do norte à periferização os projetos e às políticas públicas da área de história. O papel do curso de História é FORMAR PROFISSIONAIS CRÍTICOS, SEJA PARA A PESQUISA E PARA A DOCÊNCIA E ESTA proposta em pauta na Faculdade de História, ao invés de incluir, exclui a Amazônia da capacidade de produzir profissionais com formação ampla para o exercício profissional na docência, na pesquisa e na gestão cultural na área de História.

Belém, 22 de abril de 2023.

Profa. Dra. Leila Mourão
Professora aposentada da FAHIS, professora do PPHIST, conselheira titular da Fundação Maurício Grabois e ex-coordenadora do Projeto de Interiorização da UFPA.

Profa. Dra. Maria de Nazaré Sarges
Professora aposentada da FAHIS e professora do PPHIST, Diretora da Cátedra João Lúcio de
Azevedo/I.P. Camões e Membro da Comissão de História do IHGP.

Prof. Dr. Geraldo Mártires Coelho
Professor aposentado da FAHIS e ex-professor do PPHIST, ex-diretor do Arquivo Público Estado do Pará
e ex-presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Pará (IHGP).

Profa. Ma. Ruth Burlamaqui de Moraes
Professora aposentada da FAHIS, ex-pró-reitora de Ensino e Administração Acadêmica da UFPA e
Membro da Comissão de História do IHGP e ex-presidente da Fundação Cultural do Município de Belém
(FUMBel).

Prof. Dr. Elson Luís da Rocha Monteiro
Professor aposentado da FAHIS e Membro da Comissão de Patrimônio Histórico do IHGP.

Profa. Nilza Fialho de Andrade
Professora aposentada da FAHIS e ex-coordenadora do Colegiado do Curso de História da UFPA.

Prof. José Maurício Sombra Soares
Professor aposentado da FAHIS e ex-diretor do Departamento de História da UFPA.

Profa. Dra. Eliana Ramos Ferreira
Professora aposentada da Escola de Aplicação da UFPA e colaboradora do PROFHistória/Ananindeua/UFPA.

Profa. Dra. Conceição Almeida
Professora aposentada da Escola de Aplicação da UFPA e colaboradora do PROFHistória/Ananindeua/UFPA.

Profa. Ma. Rosana Padilha de Sousa
Professora aposentada da Escola de Aplicação da UFPA e ex-professora do Ensino Fundamental e Médio da Escola Tenente Rêgo Barros.

Prof. Ma. Stela Pojuci Ferreira de Morais
Professora aposentada da Escola de Aplicação da UFPA e ex-professora da Universidade do Estado do Pará (UEPA) e da Universidade da Amazônia (UNAMA.